domingo, 17 de abril de 2011

Cocada

Era meu gato quando morava no Rio. Ele tinha esse nome porque no tempo em que o adotamos, meu pai vendia água de coco na praia. Cocada era esperto, tranquilo e carinhoso. Meus pais nunca permitiram animal dentro de casa, então ele levava uma vida de gato de muro: caçando passarinhos, tomando sol no telhado e destruindo uma flor aqui e ali. Nos domingos eu acordava antes da casa toda e deixava ele entrar pra ficar comigo na sala enquanto eu assistia TV. Esperto, ele aproveitava a chance para burlar as leis domésticas. Tranquilo, ele se deitava do meu lado e quase dormia. Carinhoso, ele ronronava baixinho para conseguir tirar minha atenção dos desenhos animados.

Mas, Cocada era um gato. Não ficava mais de vinte minutos ali comigo. Queria logo seu quintal, seu muro, seus passarinhos... E nem por isso achava que gostava menos de mim ou eu dele, afinal, liberdade felina não é coisa para se brincar ou negar. Eu só entendia que ele queria ir, mudar, brincar. Sei que ele voltaria, mas não esperava que o fizesse, tomando sua natureza imprevisível. 

Percebi que tenho agido muito como cão e seria bom aceitar que ser gato de vez em quando é necessário. Assim como aceitar que existem muitos gatos por aí e que alguns podem voltar no domingo seguinte, outros não voltam mais.



JG

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Canções retornáveis

Hoje em dia elas nem são mais tão populares, mas há uns quinze anos atrás, era inconcebível a idéia de almoço no domingo sem Coca-Cola na garrafa retornável. Uns minutos antes de pôr a mesa com carne assada e macarronada, minha mãe gritava “João, vai na padaria comprar refrigerante”. Domingo sim, domingo não porque afinal de contas meu irmão também devia ter obrigações. E já no meio da rua minha mãe gritava de novo “Não esquece da garrafa lá no barracão!” (um espaço no fundo do quintal onde guardávamos tranqueiras).
Entregava a garrafa vazia no balcão da padaria e levava pra casa cheia. Por um tempo achei até que eles enchiam ali, na hora!
E era assim: levava vazia, enchia, bebia tudo, me deliciava e retornava. Até um ponto que deixei de esquecer a garrafa, sempre saindo de casa já com ela, e  parei de me perguntar onde eles enchiam a garrafa com o líquido maravilhoso.

Mas hoje ta tudo bem. Tirando o fato as compras que fiz com um dia de antecedência, quando, na verdade, elas deviam ser feitas no auge da carência e solidão. Compras para preencher com sacolas e etiquetas todos os espaços vazios da alma onde podem se alojar uma depressãozinha, sabe? Vai ver comprei tudo adiantado justamente para evitar ter que gastar o dobro com as lágrimas engolidas e o fone de ouvido no último volume tocando “Doth I protest too much” da Alanis.
Tava tudo bem. Foi uma premonição? Pode até ser. Porque hoje no metrô tocou Simple Together (também da Alanis) duas vezes seguidas mesmo com o shufle ligado.
Mas ta tudo bem. Com as micro-aulas de canto, improvisadas entre um vinho e os lençóis, aprendi com você a respirar: só para agora respirar fundo!
Tudo bem, as compras foram adiantadas mas o Gyn Tonica está sempre a postos na mesa do bar, na sala de estar.
Tudo bem, mesmo... Mesmo que eu não vá mais ter a chance de te escrever músicas ou entender as suas piadas. Porque só depois de sessenta e quatro anos eu começaria a entender o seu tipo de humor e quando for famoso não vai mais querer saber das minhas rimas cafonas.
Tá tudo bem, tudo bem tudo bem... Tudo dentro do mesmo ciclo de começos e fins, tão lógico e previsível à natureza humana quanto uma garrafa retornável.

Às vezes o coração da gente é assim: retornável. Quando esvazia a gente vai lá e pede pra encherem de novo, a gente bebe até a última gota, sacia a sede e sente aquela tristeza que dá em todo mundo no final do êxtase.
Outras vezes bebem todo nosso líquido e esquecem a garrafa lá no barracão, lá no fundo.

E eu? Eu vou dormir vazio e acordar cheio.

“Tonight i’m gonna rest my chemestry...” afinal, continuo “so young, so sweet, so surprised...”



JG

domingo, 10 de abril de 2011

A little cheesy jazz

(I think I'm feeling blue
but I'm not sure if blue it is
I guess it is something like this)

Sad as a table set with no flowers
Sad as the flowers waiting for a bee
Sad as the bee trying to reach outta window
The window I closed so then I couldn't see

The tables set along the walkside
The flowers blooming on trees
The bees flying upon the gardens
Flying free, free, free...

And all i wanted in this morning spring
Were you laying here next to me
Being lazy till the clocks beat noon
And have breakfast untill three

So I wouldn't feel so bad
So I'd forget how it's to feel...

Sad as a table set with no flowers
Sad as the flowers waiting for a bee
Sad as the bee trying to reach outta window
The window you closed so you could surprise me

The table is now set with flowers and candles
The flowers are smelling as the morning spring breeze
The bee can go out when you open the door
So we can be together tonight at least.

(Feeling blue is not so sad
when in the end of the day
blue is colorful instead.)